maior-participacao-feminina-na-politica-carece-de-mudanca-na-formacao-dos-brasileiros-apontam-debatedoresO que impede uma maior presença de mulheres na política e quais as estratégias para superar esses obstáculos?  O assunto foi debatido em audiência pública promovida nesta quinta-feira (17) pela Procuradoria da Mulher do Senado.

Realizado em conjunto com a Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados, o debate, mediado pela senadora Regina Sousa (PT-PI), tratou das dificuldades para a eleição de mulheres no Poder Legislativo.

Regina Sousa lamentou que ainda sejam muito restritos os espaços para mulheres na sociedade. Para ilustrar, ela contou que o Plenário do Senado, onde ocorrem as principais decisões da Casa, foi construído sem a previsão de banheiro feminino.

— Isso mostra que não se pensava que seriam eleitas senadoras — disse.

Apesar das conquistas das mulheres nas últimas décadas, a senadora disse ser preciso ampliar a presença feminina no Legislativo. Dados mostrados por Flávia Biroli, professora da Universidade de Brasília (UnB), revelam que são ocupadas por homens 91% das cadeiras na Câmara dos Deputados, 88% nos legislativos estaduais e 86% nas câmaras de vereadores.

A pesquisadora mostrou que nenhuma mulher foi eleita em expressivo número de assembleias municipais, nas últimas eleições.

— Em mais de um quarto das câmaras legislativas do país teremos apenas homens legislando — lamentou.

Olgamir Amancia, também professora da UnB, disse que houve redução no número de candidatas na última disputa eleitoral, o que seria uma contradição frente ao crescente papel feminino na sociedade.

Os caminhos para reverter esse quadro, opinou, passariam por uma divisão mais igualitária nas tarefas domésticas e na criação dos filhos, mas também pelo estímulo à formação para as atividades públicas. Essa formação, frisou a pesquisadora, deve ser permanente e ocorrer não apenas na escola, mas nas famílias, nos meios de comunicação e nos partidos.

Mudanças na legislação também são necessárias, conforme Olgamir Amancia. Ela apoiou proposta defendida pela procuradora da Mulher no Senado, Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), de implantar o sistema de lista de candidatos e candidatas pré-ordenada fechada pelos partidos, com alternância de gênero, nas eleições para deputados e vereadores.

A professora afirma que, nos países onde o sistema foi adotado, foi expressivo o aumento da presença feminina na política.

Obstáculos

Na opinião de Gabriela Cruz, da Secretaria Especial de Políticas de Igualdade Racial, obstáculos a uma maior participação feminina começam ainda na educação dada pelas famílias às meninas.

— A mulher não é criada para assumir espaços públicos, mas para ficar dentro de casa — afirmou.

Ela ressaltou ainda que as dificuldades são maiores para as mulheres negras, que enfrentam preconceito e desqualificação.

— Foram 354 anos de escravidão no Brasil, a mulher negra veio na condição de escravizada, assumiu espaços domésticos e sempre enfrentou resistência para ocupar espaços de poder — observou, ao defender a ampliação de políticas afirmativas.

Gabriela Cruz considera que os partidos políticos buscam a participação feminina apenas para cumprir exigências eleitorais nas campanhas, mas não reconhecem as mulheres como protagonistas.

Conservadorismo

Na avaliação da diplomata Marisa Nogueira, o mundo vive uma onda conservadora, que se revela, como exemplificou, na vitória de Donald Trump, um candidato com manifestações machistas e racistas, nas eleições dos Estados Unidos.

Ela lamentou que o debate sobre igualdade de gênero no Brasil quase sempre ocorra apenas entre mulheres. Para Marisa Nogueira, ainda não há o entendimento de que o tema tem impacto para o país como um todo, para toda a sociedade.

— Isso não é um discurso retórico. Há diversos estudos importantes que mostram os efeitos negativos da discriminação de gênero e da discriminação racial no desenvolvimento dos países — observou.

A situação estaria se transformando entre a nova geração, onde é maior o engajamento de homens na luta pela igualdade de gênero, conforme Eunice Borges, representante do escritório da ONU Mulheres no Brasil.

— Existe um movimento de resistência e de resiliência muito forte, de jovens, meninas e meninos, que estão lutando pela igualdade e pelos direitos humanos — disse.

Fonte: Agência Senado