Participantes de debate na Comissão de Legislação Participativa criticaram nesta quinta-feira (1º) o fim do currículo único, previsto na medida provisória da reforma do ensino médio (MP 746/16). O texto aprovado ontem (30) na comissão mista ainda precisa ser votado nos plenários da Câmara e do Senado.
O senador Pedro Chaves (PSC-MS), relator da matéria, propôs que o aluno tenha 600 horas anuais de conteúdo comum e 400 de temas específicos. Atualmente, todo o currículo é comum, de no mínimo 800 horas.
Para a professora Lisete Regina Gomes Arelaro, da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), a medida repete equívocos, como a divisão entre científico, clássico e normal, que, segundo ela, prejudicaram a aprendizagem de disciplinas que não faziam parte do currículo específico do aluno. Ela ressaltou ainda que a reforma pode acentuar as disparidades entre escolas particulares e públicas.
“Para cada vez que o Brasil estabeleceu uma possibilidade de diferenciação, as escolas públicas mais pobres, de periferia, mais longínquas foram as que ficaram sem professor, sem laboratório, sem biblioteca, sem um centro esportivo”, disse. “Por isso que a proposta não é só demagoga, é mentirosa”, afirmou a professora.
Na mesma linha, a assessora do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Cleomar Manhas, vê o risco de se aprofundar a desigualdade no ensino médio. “Quando permite que parte da formação ocorra fora da sala de aula, por instituições não reconhecidas, a reforma pode incentivar uma formação profissional precária. Vai fazer educação para pobres e para ricos”, disse.
Já o coordenador-geral de Ensino Médio do Ministério da Educação, Wisley Pereira, defendeu a flexibilidade no currículo. “O currículo brasileiro mata a criatividade dos alunos, impossibilitando que eles exerçam suas habilidades e competências. Ser democrático não é tratar todos iguais, é tratar as diferenças em igualdades”, ressaltou.
Ele informou que o ministério planeja investir na educação integral, no prazo de dez anos, R$ 2 mil por aluno ao ano, montante superior, segundo ele, aos R$ 30 por aluno ao ano pelo Mais Educação, programa anterior de suporte ao ensino integral.
Urgência da reforma
O coordenador do Programa de Cidadania dos Adolescentes do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), Mário Volpi, criticou a falta de debate sobre a reforma com alunos e professores. Ele refutou o argumento de que a proposta precisa ser analisada com urgência pelo Congresso Nacional em virtude do atual cenário de crise política.
“Quando a democracia está doente, quando ela tem problemas, a gente precisa tratá-la com mais democracia. Não existe possibilidade de se resolver os debates sem mais debate, não existe possibilidade de resolver os impasses sem mais diálogo e sem mais discussão”, lembrou.
Já o representante do Ministério da Educação, Wisley Pereira, disse que a reforma por meio de medida provisória é uma estratégia para que a reforma entre na pauta do Legislativo, o que, segundo ele, não foi alcançado pelo PL 6840/13, que também propõe mudanças no ciclo médio.
Formação de professores
A coordenadora do Fórum Estadual de Educação do Ceará, Edite Colares Oliveira Marques, disse que o foco na profissionalização do ensino a partir da atuação de profissionais com notório saber desvaloriza o papel do docente. “Considerando a subjetividade, fragiliza a formação do professor em áreas específicas”, declarou.
Edite Marques sugeriu a ampliação da capacitação profissional por meio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e da plataforma Paulo Freire, ligados ao Ministério da Educação.
O presidente do colegiado, deputado Chico Lopes (PCdoB-CE), também cobrou mais esclarecimentos sobre a atuação de profissionais com notório saber no ensino médio e pediu mais reflexão sobre a reforma. “O ensino também é transformador, se ele não for transformador, ele é alienador. Isso é tão ruim como a ausência dele”, declarou.
A MP 746 permite que profissionais de “notório saber” sejam contratados para dar aula de formação técnica e profissional, mesmo que não tenham licenciatura na respectiva área.
Fonte: Agência Câmara Notícias