A reforma no ensino médio, que pode resultar na maior alteração na estrutura dessa etapa escolar desde a implantação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDO), será a primeira matéria a ser analisada pelo Plenário do Senado no retorno das atividades legislativas, a partir de 2 de fevereiro. A Medida Provisória (MP) 746/2016, que trata do tema, tranca a pauta de deliberações e precisa ser votada antes de todas as que se encontram na agenda.
Desde sua edição pelo governo, em setembro de 2016, a matéria dividiu opiniões. O protesto dos estudantes contra a medida envolveu ocupações de escolas públicas secundaristas em todo o país. Com ajustes nos pontos mais criticados, a MP foi aprovada pela Câmara dos Deputados em 30 de novembro. Porém, o texto resultante, na forma do Projeto de Lei de Conversão (PLV) 34/2016, chegou ao Senado apenas no dia 14 dezembro, o último de votações na Casa antes do recesso parlamentar. Por isso, o exame ficou para 2017.
A MP havia passado inicialmente pela análise de comissão mista de deputados e senadores. Como as discussões se prolongaram, o prazo de vigência foi prorrogado por mais 60 dias, até o dia 2 de março. Portanto, após a retomada das atividades, os senadores terão somente um mês para deliberar sobre a MP 746. Caso não seja aprovada até 2 de março, a matéria perderá a validade.
Tempo integral
Uma das importantes mudanças determinadas pela MP é a adoção do ensino médio em tempo integral. Originalmente, a proposta do governo ampliava a carga horária mínima anual, hoje fixada em 800 horas, para 1,4 mil horas, de forma progressiva, mas sem fixar prazos. Os deputados conservaram a carga de 1,4 mil horas, mas incluíram a previsão de que, em até cinco anos, a partir da publicação das mudanças na lei, os sistemas de ensino já garantam a oferta de ao menos mil horas anuais.
Para os críticos, a principal dificuldade para a implantação do tempo integral é a falta de recursos para investir nas escolas públicas, o que agravaria desigualdades em relação às escolas privadas, que podem viabilizar a ampliação de turno com aumento de mensalidades. Manifestaram esse temor três ex-titulares do ministério da Educação: Aloizio Mercadante, Renato Janine Ribeiro e Henrique Paim. O Ministério da Educação prevê programa específico com R$ 1,5 bilhão para incentivar a adoção pelas escolas do ensino em tempo integral.
Currículo flexível
Outro ponto central é a flexibilização curricular, com redução do conteúdo obrigatório para que sejam privilegiadas cinco áreas de concentração: linguagens, matemática, ciências da natureza, ciências humanas e formação técnica e profissional. A intenção do governo federal era incentivar as redes de ensino a ofertar ao aluno a oportunidade de dar maior ênfase em seus estudos a alguma dessas cinco áreas, também chamadas de “itinerários formativos”.
No texto original da MP, entre os conteúdos que deixariam de ser obrigatórios nesta fase de ensino estavam artes, educação física, filosofia e sociologia. A rigor, o conteúdo dessas disciplinas não seria eliminado, mas o que seria ensinado de cada uma delas ficara na dependência do que viesse a ser determinado como conteúdo obrigatório previsto na futura Base Nacional Comum Curricular (BNCC).
Diante das fortes críticas, centradas na necessidade de os jovens serem contemplados contassem com formação mais reflexiva, os deputados optaram por deixar claro no texto da MP a inclusão da obrigatoriedade das quatro disciplinas na base nacional comum. Além disso, a Câmara ampliou de 50% para 60% a composição do currículo da etapa preenchido por essa base comum. Os 40% restantes serão destinados aos itinerários formativos, por escolha do estudante.
Urgência questionada
As críticas à reforma do ensino médio se centraram ainda na opção do governo federal por tratar o assunto por meio de medida provisória. Para parlamentares oposicionistas, a proposta não atende pressupostos de urgência e relevância necessários à edição da MP e, por consequência, rito mais acelerado para a matéria. A justificativa é de que não se pode criar obstáculo ao debate de tema de natureza complexa, que depende de mais tempo para a formação de acordos.
O governo, contudo, argumentou que a relevância da reforma está na importância da educação para o desenvolvimento do país, e que a urgência se justificaria nos baixos índices de desempenho dos estudantes do ensino médio e na alta evasão escolar. Insatisfeito com a solução, o PSOL, um dos partidos de oposição ao governo, moveu ação junto ao Supremo Tribunal Federal questionando a constitucionalidade da iniciativa.
Ao opinar sobre a questão, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, considerou que de fato não estão presentes os requisitos de relevância e urgência para justificar a edição de MP sobre a reforma do ensino médio. A ação ainda não foi pautada para julgamento.
Fonte: Agência Senado