Os recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) são do trabalhador, e não do governo. Precisam, portanto, ser geridos de forma a garantir mais remuneração a seus verdadeiros donos. Foi o que defendeu o presidente do Instituto Fundo Devido ao Trabalhador (IFDT), Mario Avelino, em audiência pública da Comissão de Direitos Humanos (CDH), nesta segunda-feira (28), para debater a gestão do FGTS, que completou 50 anos.
O maior fundo social privado da América Latina, o FGTS tem recursos de cerca de R$ 500 bilhões, usados pelo governo para investimentos em habitação, saneamento básico e infraestrutura. Desse montante, 80% são depósitos vinculados (R$ 400 bilhões) e 20% (R$ 100 bilhões), patrimônio líquido, uma espécie de fundo de reserva.
Apesar do valor expressivo, foram muitas as perdas impostas ao trabalhador ao longo das décadas graças a alterações legislativas que diminuíram a remuneração, explicou Avelino. Entre elas, a modificação dos juros progressivos aplicados ao saldo; a troca da correção monetária, pela inflação, por apenas uma atualização monetária e a criação da taxa referencial (TR); a redução dos juros e multas pagos pelos empregadores em caso de atraso do pagamento; e a diminuição da prescrição das ações trabalhistas de 30 anos para cinco.
Por outro lado, o governo tem aproveitado os recursos para investir e lucrar, especialmente no mercado financeiro, sem dividir os lucros com os trabalhadores, denunciou o dirigente do IFDT. Em 2015, foram R$ 13,5 bilhões de lucro líquido. O montante do Fundo de Investimento do FGTS é aplicado no mercado financeiro, com remuneração pela taxa Selic enquanto o saldo do trabalhador é corrigido num montante muito menor. Para Avelino, isso é confisco legal, um roubo legalizado.
— O FGTS tem recursos fantásticos, mas um quinto dele está no mercado financeiro. É um funding fantástico, recebo 14% ao ano e pago 4,8%. E para onde vai esse dinheiro? O patrimônio líquido é uma consequência, tem que ter uma reserva. Agora uma reserva que sobe 900% em 12 anos e o rendimento do trabalhador sobe 90%? — criticou.
Ainda de acordo com o dirigente, o FGTS poderia hoje contar com R$ 800 bilhões em recursos, disponíveis para investimentos em obras para melhorar o saneamento e, consequentemente, a saúde da população. Seria primordial no combate a dengue, chicungunha e zica, por exemplo. Por isso, ele defendeu a aprovação do PLS 581/2007, do senador Paulo Paim (PT-RS), que resgata várias das diretrizes da Lei 5.107/1966, por meio da qual foi criado o fundo, descaracterizada ao longo dos anos. Ele também criticou iniciativas como as que preveem o uso dos recursos do FGTS para pagar, por exemplo, universidade ou curso técnico, pois “dinheiro fácil é endividamento”.
Positivo
Tanto Bolivar Tarragó, do Conselho Curador do FGTS, quanto Henrique Santana, superintendente nacional do fundo, defenderam o FGTS como importante para a economia e a sociedade. Ambos frisaram que a administração dos recursos é compartilhada, supervisionada, auditada e com diretrizes determinadas pelo conselho curador, que tem representantes do governo, de empregados e de patrões. Todos os anos são aplicados cerca de R$ 55 bilhões em habitação.
— De cada dez casas construídas, oito são com recursos do fundo, 88% dos imóveis são lastreado com recursos do FGTS — disse Henrique Santana.
O dirigente também negou que os investimentos sejam feitos essencialmente no mercado financeiro, mas sim em financiamentos a juros baixos, que beneficiam o próprio cotista do FGTS. Ele negou ainda que os empregadores sejam grandes “caloteiros”, já que esmagadora maioria paga tudo em dia.
— Os empregadores que atrasam não superam 3%, com 97% que paga em dia, fazem o depósito regular nas contas vinculadas do FGTS — registrou Santana.
Bolivar Tarragó concordou que a discussão suscitada por Avelino é importante, mas ponderou que as mudanças devem ser muito bem discutidas e pensadas, de forma que se mantenha a sustentabilidade do fundo. Ele lembrou que há pouco mais de 20 anos os recursos do FGTS foram dilapidados e que manter a saúde do FGTS é essencial para garantir sua capacidade de investimento.
— É preciso ter cuidado com propostas ligeiras que supostamente beneficiariam os trabalhadores, mas que comprometem a sustentabilidade do FGTS — alertou.
Sindicatos
Vários dirigentes e integrantes de sindicatos e confederações também participaram da audiência pública. Todos deixaram registrado que a PEC 55/2016, do teto de gastos, pode vir a afetar ainda mais os direitos do trabalhador. A limitação de recursos vai tornar mais difícil, por exemplo, a fiscalização feita pelos auditores do trabalho, que lutam contra a informalidade e a irregularidade nos contratos.
— A robustez do fundo depende do emprego, em risco com a situação de crise econômica que vivemos, sem investimento na produção, mas sem limite para os bancos. Se a gente não acelera a economia, tudo vai arrecadar menos, e o fundo de garantia vai estar cada vez mais precarizado — lamentou Gláucia Morelli, presidente Confederação das Mulheres do Brasil.
Fonte: Agência Senado